Todos ouviam falar de um evento que estava causando tremendo burburinho pelas bucólicas ruas. Era Setembro de 1864 e o evento era a Primeira Associação Internacional dos Trabalhadores em Londres. Um certo doutor Marx estava por lá. O sujeito era de fato bastante influente para os de sua classe. Estive por ali prestando serviço militar, fazendo guarda para o caso de acontecer algum tipo de balburdia entre aqueles enérgicos homens, porém apenas vi ali um monte de trabalhadores, gente humilde, discutindo soluções para sua classe, independente da filosofia achei-os dignos de admiração.
Retornei à casa pensativo, havia naquela época uma epidemia de cólera que aterrorizava toda a cidade, o rio Tâmisa fedia como carne putrefata, eu andava procurando motivos para sair da cidade, como meu pai já tinha feito, o velho Baskerville estava na África, em uma expedição. Chegando ao portão da casa de minha família no distrito de Nottin Hill, um carteiro me aborda:
"-Você é Michael Baskerville?"
"-Sim..."
"-Correspondência para o senhor."
A carta vinha de Bampton e o remetente vinha assinado com o nome do reverendo Curtis. Aquela carta trouxe-me algumas recordações, uma delas era do incidente do qual fui interceder naquele vilarejo de Bampton, uma outra lembrança foi realçada em minha mente ao ler o nome que constava também na carta, Joana Thompson. No papel, li estas palavras escritas pelo meu amigo reverendo:
"Jovem Michael,que saudades sinto de ti, meu amigo. Certamente uma certa senhorita Joana Thompson sente muito mais a sua falta do que eu. Todavia, espero que você e seu pai estejam muito bem de saúde. Os senhores estão em minhas orações todas as Missas!
Sem rodeios, mais uma vez meu jovem, quero pedir-lhe auxílio. Vou lhe pedir que venha a Bampton uma outra vez, mas não pense que essa idéia partiu de mim, não sou eu quem lhe peço para vir até aqui resolver questões de nosso vilarejo, é o prefeito quem lhe chama desta vez. Todos aqui gostaram muito da sua ação resolvendo aquela arrelia cinco anos atrás, puxa já faz cinco anos! Quanto tempo ficastes afastado de nosso convívio, moço! O nosso amigo prefeito, tem um caso muito interessante e ao mesmo tempo intrigante para ser resolvido, espero encarecidamente que o senhor não esteja prestando serviço militar no momento e possa passar um tempo aqui conosco nos ajudando. Lhe darei os detalhes depois que me responder e chegar aqui, venha o mais rápido que puder. E diga-me, como está a velha Londres? Saudades dessa terra. Que Deus abençoe a você e seu pai.
Cordialmente Curtis."
Mas ora essa, recebi de fato essa alcunha de detetive! Exclamei comigo mesmo, e de fato eu vinha lendo cada vez mais contos policiais cheios de aventura e mistérios, acabava por aperfeiçoar minhas técnicas de dedução sem perceber. Eu estava prestes a entrar de férias e queria mesmo estar longe de Londres, decidi rumar para Bampton e conferir o que me aguardava dessa vez naquele lugar.
II-A Nova Jornada
Tomei minhas providências cabíveis no quartel, avisei ao meu pai pelo serviço de telegrafia dos militares que eu estava voltando a Oxfordshire responder mais um chamado de seu velho amigo Curtis em Bampton. De malas prontas, equipado com minha arma, meus livros e minha fome de aventura, parti.
Quando cheguei à cidade, percebi que ela pouco mudara nos últimos 5 anos. Percebi agora, mais do que da última vez em que estive aqui, as diferenças entre a cinzenta Londres e Oxfordshire. Eu também havia amadurecido bastante nos últimos anos, aperfeiçoei meus conhecimentos em medicina, botânica, química e claro, informalmente na arte da investigação. Além disso, não era o mesmo garoto inexperiente que esteve em Bampton anteriormente, não me apaixonaria novamente por uma jovem, até porquê, eu estava para noivar com uma linda moça que conheci em Londres, Jéssica.
O prefeito, de braços abertos me saudava alegremente, junto ao reverendo, antes mesmo do cabriolé que me trazia frear.
"-Se não é meu detetive favorito! Veja Curtis, já cresceu barba na face do rapazote."Eles reparando nas mudanças do meu corpo e eu me sentia como um zigoto recém fecundado.
"-Widmore, você está constrangendo nosso detetive." Aquelas palavras quase paternais do reverendo Curis, deixavam-me ainda mais vexado.
"-Boa tarde, senhores." Cumprimentei-os.
Como resposta, obtive um abraço forte do prefeito Widmore e apertos na face pelas mãos do reverendo. O criado particular e bajulador Perkins, tratou de carregar minhas malas e rumamos para o gabinete do prefeito.
Já instalado na região, comecei então a me interar sobre como as coisas estavam por ali. Perguntei a eles se tinham notícias da jovem Kate e sua mãe, afinal, Widmore querendo ou não, era responsável por ambas. Ele me disse que preferia não se manter muito próximo a elas, para não atrapalhar em sua reintegração social , mas disse também que sabia que elas estavam indo muito bem. O reverendo veio logo me informando sobre o que eu nem iria perguntar, Joana Thompson, ele disse:
"-Jovem Michael, apenas brinquei com o senhor na carta que lhe enviei, soube que o senhor estava noivo por seu pai, então resolvi apenas lhe colocar uma pulga atrás da orelha. Joana Thompson se casou na primavera passada. Acho que ela nem lembra do senhor, confesso que mencionei-a também para ver se despertava ainda mais no senhor a vontade de atender nosso chamado."
"-Isso não seria necessário, reverendo." Aquele velho estava ficando cada vez mais sórdido, relevei e finalmente quis ir direto ao assunto: "Então, qual é a importância de minha vinda, senhores?"
"Oh, veja. Já está apressado! Primeiro o chá, depois a conversa. Perkins! Tenha bondade de nos servir, por favor." E então, depois de todas aquelas delongas, começamos a falar sobre o caso, e o caso era seriíssimo, assassinato.
III- O Crime
"-Comecemos do início. Fiz o senhor receber nosso chamado o mais rápido possível, movendo meus pauzinhos." Falou-me o prefeito. "Como podes imaginar, eu tenho amigos importantes por todo solo inglês, meu filho, isso me traz alguns privilégios. Tomei uso de meus contatos para traze-lo aqui o mais rápido o possível, para que cheguemos o quanto antes em Oxford."
"-Oxford?" Interrompi-o.
"-Sim, Oxford. Gostaria que investigasse um assassinato ocorrido lá."
Assassinato. Isso já era subir bastante o nível para um detetive de um caso só como eu.
"-Mas e quanto a polícia de Oxford? Eles não têm um pessoal especializado para este tipo de delito?"
"-Certamente. Entretanto, é neste ponto que sua ajuda é necessária. Deixe-me explicar. O investigador da polícia de Oxford é meu amigo de colégio e a pessoa assassinada é o irmão dele. Seus superiores não o deixaram se envolver no caso, então ele decidiu investigar isso por conta própria, porém fora afastado quando souberam que tinha se envolvido. O nome do meu amigo é Ray Olsen, tive a oportunidade de saber todo o seu problema por um telegrama que ele me enviou, fiquei muito aluído com a situação de meu amigo Ray, por isso, rapidamente me veio a cabeça seu nome, sr. Michael Baskerville, pensei logo em chamar-lhe para ajudar no caso do assassinato do irmão de Ray, pois ele não confia nem um pouco nos demais investigadores de Oxford, disse-me que os melhores detetives estão na Scotland Yard, sabendo que o senhor é de Londres, tratei de falar com ele que o acionaria para vir ajudá-lo, ele concordou e disse que lhe daria todo o apoio necessário. O que me diz?"
"-Realmente, é uma ocasião sufocante, quando um detetive não pode investigar a morte do próprio irmão. Fale-me mais sobre as circunstâncias do assassinato? Quando ocorreu? Onde exatamente? O que mais sabe sobre a vítima?"
"-Bem, Michael. O que eu sei é que ele lecionava na Universidade de Oxford. Foi encontrado morto na sua sala ontem pela manhã, envenenado. O próprio Ray foi o primeiro oficial da polícia a chegar ao corpo do irmão, que se não mencionei chamava-se Rick Olsen, junto ao defunto, estava uma xícara de chá, pão e nozes. No ar, Ray sentiu um forte cheiro de amêndoas...
"-Cianureto. Veneno poderoso, mata por sufocamento. Pode ter entrado em contato com o chá quente e liberado o odor caractéristico, semelhante a amêndoas secas." apressadamente, interrompi-o antes de acabar seus relatos, mesmo sabendo que fazer isso era um erro.
"-Exato! Estamos diante de um prodígio Curtis, não canso de me impressionar com o jovem Baskerville! Deduziu que era cianureto o veneno usado apenas por eu ter citado o cheiro de amêndoas! Imagino eu, que algum estudante da faculdade pode ter acesso a este componente em um laboratório de química, certo? O que acha? Algum estudante lunático pode ter matado o homem..."
"-Pode ser..." respondi.
"-Então, vai ajudar a meu amigo em Oxford? Ainda não me respondeu."
Pensei, continuei calado. O reverendo Curtis olhava-me ansioso pela resposta. Os olhos do velho Widmore também não cessavam de minuciar minha face.
"-Diga-me, seu amigo Ray será capaz de me ajudar de maneira que eu obtenha todos os fatos que a polícia obtiver, se possível antes? Fará com que eu possa averiguar a faculdade, examinar a sala, me fornecer qualquer material ou providência que eu precisar? Além, é claro, de possibilitar que eu veja o corpo de Rick Olsen?"
"-Com certeza, sr. Michael. Ray fará de tudo para que o senhor ajude-o a encontrar o responsável pela morte do irmão. Além, é claro, de que ele pagará o senhor e muito bem, caso resolva o mistério."
"-Então, se ele garantir que poderei intervir no caso dentro da lei, sem o envolvimento da polícia, inclusive dele só precisarei da ajuda quando eu pedir, porque de fato, sendo ele irmão da vítima, sua proximidade nas investigações podem trazer atrasos. Nessas condições, eu aceito."
"-Excelente, Baskerville! Sabia que podia contar com o senhor. Mandarei que Perkis envie um telegrama para Ray agora mesmo. Amanhã o senhor chegará a Oxford."
"-Somente eu? Não conheço Oxford. O senhor não virá comigo?"
"-Infelizmente não poderei. Tenho muitas coisas para resolver aqui em Bamptom. Mas... Curtis conhece Oxford, não é Curtis?"
"-Sim conheço." Respondeu o reverendo que de fato, estava louco de vontade de me acompanhar na aventura.
"-Pois então você irá com Michael. Amanhã, os dois chegarão a Oxford."
Todos concordaram .Senti que tinha um caso bastante interessante em minhas mãos.
IV- Em Oxford
De Bampton para Oxford, a carroça particular do prefeito nos levou. Por todo o caminho minha mente estava voltada para o caso. Curtis muito falava, coisas sobre Oxford, nada de relevante para mim. Eu concordava com a cabeça mesmo sem praticamente ouvir o que ele dizia. Nós tínhamos o endereço da residência de Ray Olsen,
depois de uma longa noite de viagem, da qual eu mal descansei, chegamos ao local. Curtis bateu à sua porta e nos apresentou. O homem nos aguardava. Ray era branco e um pouco pálido, usava roupas simples, cabelos negros despenteados e tinha os sapatos mal tratados, deduzi que era um homem desapegado de supérfluos, mesmo sendo bem remunerado, como eram os bons policias ou estava assim pela recente morte do irmão. Pelos sapatos gastos, notei que andara bastante, com certeza resolvendo seus casos. Ele estava ansioso e foi bastante receptivo. Depois de nos alojar, sentamos para um chá e conversamos.
"-Então, seu irmão foi encontrado morto dois dias atrás?" Perguntei para aquele homem, Ray Olsen, aparentava ser da idade do prefeito, me sentia sem graça em ajudar-lhe e fazer-lhe perguntas como seu eu fosse mais sábio. Ray era um investigador da polícia e eu um jovem cabo do exército.
"-Exatamente. Envenenado por cianureto, que foi encontrado no chá que ele tomava. E por favor, não digas que ele cometeu suicídio, meu irmão não teria tal motivo." Mas ele me respondia normalmente, não demonstrando incômodo pelo fato de eu ser mais jovem.
"-Hum... Sinto muito pela sua perda. Pelo que pode me adiantar Widmore, Rick era professor na faculdade, qual disciplina lecionava?"
"-Filosofia. Rick era demasiado querido entre seus alunos. Muitos deles o admiravam por causa de algumas obras literárias que ele publicou baseadas em exames meticulosos das obras de pensadores como Auguste Comte e seu Positivismo e também de nosso compatriota John Stuart Mill..."
"-Economista genial e um grande pensador da área do Utilitarismo, "Agir sempre de forma a produzir a maior quantidade de bem-estar."" Eu havia realmente adotado essa mania ruim de interromper as pessoas.
"-Isso, meu irmão era um grande homem. Não consigo pensar em nenhum suspeito, só sei, que tal criminoso teve fácil acesso a Universidade, entretanto todos gostavam de meu irmão na Faculdade de Oxford. Alguém entrou de fora e o envenenou! Se eu pego o desgraçado não sei o que seria capaz de fazer...!"
"-Acalme-se homem, um bom sujeito como seu irmão provavelmente está no Reino dos Céus com o senhor Deus agora, e de certo, não gostaria de vê-lo cometer atos irracionais em nome de vingança." Disse o reverendo, tentando acalmar a Ray.
"-Sim. O senhor tem razão padre, faça orações à alma de irmão por favor, tenho certeza de que ele está num lugar melhor que esse mundo de assassinos agora."
"-Então, Rick era uma figura carismática... Concluí, mas agora era a vez de Ray me interromper.
"-Sim e isso pode trazer inveja de alguns, mas a ponto de desejar sua morte, acho pouco provável, todavia, é uma possibilidade. Rick não tinha muitos amigos próximos, apenas conhecidos. Mas nenhum deles frequentava sua casa. Acho que somente eu fazia isso."
"-Rick era solteiro? Sem filhos? Algum divórcio?"
"-Ele nuca se casou. Não teve filhos. Contudo, era um homem um tanto piegas em seus amores, lembro-me de uma namorada da juventude, ele vivia em função dela, só que a vida lhes deu rumos diferentes e se separaram. Ele era bem fechado a falar de sua vida amorosa, só soube dos relacionamentos que teve, porque alguns presenciei eu mesmo, pois ele nada comentava sobre as mulheres que conhecia."
"-Entendi. Bem, seria possível eu ter acesso a sala dele na faculdade? E também gostaria de visitar sua casa."
"-Bom, o senhor não é da polícia, mas é um detetive. Arranjarei-lhe uma identificação de detetive, assim você terá acesso a universidade sem problemas. Melhor você ir visitar a casa de Rick primeiro, enquanto eu agilizo uma identificação de investigador para você."
"-Certo, faremos isso."
Tomando posse do endereço, apanhamos um cabriolé até à casa de Rick. Pelo caminho eu observava as pacatas ruas de Oxford, percebi uma grande quantidade de estudantes indo e vindo com livros em baixo do braço, grupos perambulavam aqui e ali e eu os olhava imaginando a possibilidade de algum deles ser um assassino.
Um corpo envenenado, a vítima um homem distinto e pacato, mas eu ainda achava que pouco sabia dele, antes de ver a sua residência. Finalmente, chegamos. Fazia frio e as árvores daquele lugar deixavam a paisagem congelantemente estática. O vento soprava forte e fez meu sobretudo esvoaçar, chicoteando-o contra meu dorso. Curtis catava as moedas para pagar o homem do cabriolé enquanto eu olhei para o lado e no meio de uma rajada de vento, vi surgir uma moça, uma linda moça. Tinha olhos de um verde que não se encontra na natureza e cabelos negros que faziam caracóis nas pontas dos cachos. O efeito do vento no seu vestido, acentuava as curvas de seu corpo. Eu ainda contemplava embasbacado a beleza das formas daquela figura, quando o reverendo acabou com a sublime cena:
"-Uma blasfemadora cigana! Veja os brincos, anéis e pulseiras, sem falar no vestido desses vagabundos nômades! Será que em qualquer lugar que formos teremos hereges em nosso calcanhar?"
Curtis não era um perito na ciência da dedução, porém fez observações pertinentes quanto aquela garota, que se tivesse 20 anos era muito, daria 18 ou 17 para ela. Logo depois que cessaram as palavras do reverendo, também ela disparou as suas:
"-Esta rua cheira a paixão, traições e mentiras! E o pior de tudo, está exalando morte por todos os seus pontos de energia."
A garota estava trêmula e vinha andando em nossa direção, atravessou-nos a frente, e continuou andando. O reverendo disse que ela estava provavelmente cheia de imundiças de algum espírito maléfico. Eu também sou cristão mas enxergo no reverendo um certo tradicionalismo exagerado. Adiante, entramos na residência de Rick;
a casa estava bem arrumada e conservada, segurei Curtis pelo braço fazendo-o parar, tomei sua dianteira e inicie a observar tudo, alertei a Curtis que pisasse onde eu pisei e só fosse onde eu for ou que ficasse ali parado sem em nada tocar. Expliquei a ele que objetos pessoais podem dizer muito sobre alguém e sua casa e seu lugar de trabalho podem dizer claramente as ações por ele tomadas recentemente. Iniciei pela sala, examinei-a inteira em cerca de vinte minutos, minha face era de concentração, o reverendo não ousava dizer nada. Fui para o quarto, gastei ali também um certo tempo e finalmente rumei para seu escrivania, onde seus livros estavam simetricamente arrumados na prateleira. Examinei sua máquina de escrever, li seus escritos recentes, pus então a mão na lixeira de papéis que ficava ao lado do assento cujo o falecido professor sentava-se ao escrever, retirei todos os papéis e os coloquei em uma sacola, entreguei a meu companheiro Curtis e pedi que ele a trouxesse conosco. Depois de examinar tudo, sugeri que voltássemos para o hotel reservado a nós pelo prefeito Widmore, Curtis me perguntou:
"-E então, o que achou da casa?"
"-Uma bela casa."
"-É, também acho. Uma pena não termos achado nada relevante para o caso..."
"-Não diga isso, caro amigo reverendo! Todos os fatos são relevantes. Veja, logo que entramos, notei que uma mulher esteve aqui recentemente."
"-Mas como? Não vejo nenhum objeto feminino nessa casa."
"-Reverendo, a presença de uma mulher numa casa pode ser notada simplesmente pela disposição dos objetos e dos móveis. A arrumação desta casa está milimétricamente feita por uma mulher, pois está idêntica as arrumações feitas pela minha avó em sua antiga casa de campo, e da minha tia, e da minha noiva. Claro, isto apenas foi uma sugestão de minha mente, nada impediria Rick de arrumar sua casa de acordo com a forma da casa de sua mãe ou de parenta da qual ele tenha convivido. Enfim, tive certeza que uma mulher não só esteve recentemente aqui, como também frequentava sua casa e ela era ruiva."
"-O senhor não cansa de surpreender com seus talentos? Como, homem de Deus, pode dizer que uma mulher ruiva estivera aqui?"
"-Isso foi muito fácil, os meus olhos viram, mas os do senhor talvez não tenham visto, pois o senhor não os tem apurados para a investigação. De fato, foi muito fácil deduzir a presença de uma mulher ruiva ao encontrar na pia do banheiro longos cabelos ruivos enroscados e no quarto de Rick, um forte perfume de uma colônia muito famosa na França, a colônia chama-se "Encanto". Quanto ao lixo do escritório pode nos dizer muito mais, porém é melhor voltarmos ao hotel examina-lo cuidadosamente por lá, já que não somos policiais e estamos na casa de um estranho."
Assim, partimos.
V- O Segundo Cadáver
No hotel, descansava o velho reverendo enquanto eu examinava e mexia nos papéis retirados da lixeira de Rick. Encontrei um bilhete, uma mensagem sem assinatura, pelo conteúdo minhas suspeitas de que a mulher ruiva estivera e certamente frequentava a casa de Rick se confirmaram. O bilhete dizia assim:
" É bom estar com você, meu querido. Sou grata por tê-lo conhecido..."
Essa mulher era evidentemente um afeto amoroso do professor, todavia, me intrigava a carta estar amassada, rasgada e atirada ao lixo. Minha cabeça borbulhava em idéias e teorias. Essa excitação me empolgava e me deixava louco para testar minhas teorias. Decidi ir procurar Ray, para ver se ele havia me arranjado a licença de detetive que me prometera. Chamei o reverendo que preferiu ficar em seu aposento relaxando. Deixei-o e fui me embora.
Cheguei a delegacia perguntando por Ray, que de súbito vinha saindo ofegante. Ele apenas disse que um oficial achou um cadáver perto dali, me pediu para que o acompanhasse e eu o fiz. O detetive Ray conseguiu uma identificação qualquer para mim, seus amigos com contatos importantes agilizaram tal documento, mesmo sem eu jamais ter feito especialização acadêmica para isso.
Numa casa recatada onde vivia um casal, o homem fora assassinado e a esposa sumira. O corpo foi achado por um vizinho, que estranhou o silêncio da residência e a ausência do casal que a tempos não era visto. Bateu a porta e ninguém atendeu, forçou a maçaneta e deu de cara com o defunto. Que aparentava estar morto a dias. Deixei o detetive fazer seu trabalho e examinar a cena. Eu esperava por ele distanciado e ansioso, pois eu queria conversar sobre o caso de seu irmão. Eis que no chão eu vi uma coisa que me intrigou e chamei a Ray, encontrei um longo fio de cabelo vermelho. Não queria interferir na investigação de Ray, entretanto, me entrometi. Perguntei se a mulher que sumira, a esposa do homem assassinado, era ruiva. O vizinho, que por ali ainda estava, confirmou que sim. Permaneci calado, com minha testa franzida, expressão que eu costumava fazer quando pensava, teorizava e concluía. Olhei para algumas pinturas na parede, uma delas era do casal. A bela ruiva de uns 35 anos e seu esposo, um homem que aparentava ser mais velho, por volta dos 42, 43.Perguntei o nome do casal: Mary-Kate Houston e John Houston. Calei-me e fui aguardar lá fora. Aproveitei e observei todo perímetro da casa,continuava pensativo, reparei bem no gramado, tentei focar nas pegadas antigas só que as recentes estavam por todo o solo, deixando meu trabalho impossível. Finalmente, o detetive saiu da casa e pudemos conversar:
"-Assassinato! O pobre homem foi sufocado..." iniciou Ray.
"-Sim, pude perceber pelos olhos avermelhados e pelas hematomas no pescoço." concluí eu.
"-Então, foi à casa de Rick? Eu não tive tal oportunidade..." disse-me Ray.
"-Fui sim. Tirei algumas conclusões...Prefiro não comentá-las com você ainda, isso pode acabar influenciando meus pensamentos na hora em que precisar teorizar sobre alguns fatos dos quais ainda não obtive muitos detalhes. Por isso estou aqui agora, queria saber quando poderei ir até a Faculdade de Oxford."
"-Quando quiser! A propósito, aqui está a indentificação de detetive particular que fiquei de lhe arranjar, sr. Michael. Já percebi que tipo de investigador é você, do tipo que guarda suas teorias e prefere obter cada vez mais pistas e fatos, para assim, poder teorizar e testar suas teses. É um método eficaz."
"-De fato é! Obrigado pela identificação, agora não perderei tempo. Irei almoçar com meu amigo Curtis, depois rumarei para a Faculdade."
VI- Na Sala do Professor
Um homem que se hospedava no quarto ao lado do nosso, nos indicou um restaurante próximo à faculdade. De lá, era possível enxergar todo o campus com alguns de seus edifícios e alojamentos. O reverendo pediu a comida e durante toda a refeição permaneci calado. Meu corpo era por dentro, como uma embarcação no âmago de uma nebulosa tempestade. O silêncio rompeu quando Curtis me perguntou:
"-Acha que a mulher ruiva pode ter matado a Rick?"
Eu respondi com outra pergunta:
"-O que a Igreja diz sobre suicidas?"
"-Ora, você sabe. Aquele que tira a própria vida está condenado ao Inferno, pois a vida é um dom de Deus e só Ele pode dá-la ou tirá-la. Acha que Rick se matou?"
"-Por quê não? Só porque Ray disse que ele não seria capaz disso? Reverendo, o problema dos investigadores é que eles são humanos; entre os humanos são poucos os que agem com a razão ao invés da emoção."
"-Isso é verdade, meu jovem."
"-Quanto a mulher ruiva..." Disse eu. "-Ela se chama Mary-Kate Houston e está desaparecida."
"-hahaha! O senhor está blefando, jovem Michael!"
"-Não, não estou. Estive na casa dela ainda a pouco."
"-O senhor poderia fazer a bondade de me situar, afinal de contas?!"
"-Claro. Quando fui falar com Ray mais cedo, ele estava se dirigindo para uma casa onde havia acontecido um assassinato. Na casa morava o casal Mary-Kate e John Houston. O homem foi morto, estrangulado por mãos nuas e a mulher sumira. A suspeita era de morte e sequestro, ação de algum lunático psicopata, todavia eu tenho outra opinião sobre os fatos..."
"-Mas pelo o amor do Santo Cristo! O senhor pode me dizer como é capaz de afirmar que essa Mary-Kate é a mesma mulher que soubemos que esteve na casa de Rick?"
"-Sim,direi. O perfume,"Encanto" que se tornou muito fácil de reconhecer ao meu nariz, pois dei de presente à minha noiva no último Natal, estava exalando pelo sofá daquela casa e também pude reparar em um frasco quase cheio em cima do móvel..."
"-Michael, você tem noção de quantas mulheres ruivas podem possuir este perfume em Oxford?!"
"-Certamente uma grande quantidade, tendo em vista que é um perfume da moda. Porém, caríssimo reverendo, a caligrafia de uma pessoa é algo muito particular e muito fácil de reconhecer após uma breve análise. Lembra-se do bilhete que encontrei na lixeira de Rick? Pois vi a mesma grafia neste papel que encontrei e delicadamente subtraí da casa dos Houston."
Mostrei então ao reverendo um bilhete escrito e assinado por Mary-Kate Houston:
"Meu amor, logo estaremos juntos. Seja paciente. Tudo está indo de acordo com o planejado.
De sua paixão, Mary-Kate Houston"
O reverendo leu aquilo alarmado, "Impressionante" ele disse. "Isso quer dizer que Rick estava envolvido com uma mulher casada, isso já é bastante relevante para o caso!"
"-Sem dúvida" respondi.
"-Em que parte da casa o senhor encontrou este bilhete?"
"-Do lado de fora, no jardim. Provavelmente, ela iria entregar quando o deixou cair, por algum motivo. Eu e Ray fomos os primeiros detetives a chegar à casa, apanhei o papel sem ele ver, quando eu o esperava lá fora. Preferi pegar o papel sem mostrar a ele quando comecei a suspeitar de que este caso e o do seu irmão, podiam estar ligados, logo após ter encontrado o fio de cabelo vermelho e sentido o perfume na casa."
"-Nossa, este caso está começando a tomar forma.Rick era um adúltero! Quem diria. Será que a mulher é a homicida?"
"-Bem agora chega de falar, antes que comecemos a tomar conclusões precipitadas, vamos para a Universidade de uma vez." Encerrei.
Na faculdade, conversamos com alguns professores, pude assim, saber mais sobre o comportamento de Rick nos últimos dias, como ele se comportava e se andava estranho. As respostas que tive deixavam transparecer que aquele homem andava mais afastado, desatento e um tanto disperso. Características notáveis aos que mantém um relacionamento às escondidas. Ganhei rumo para a sala reservada do professor Rick, onde encontrei evidências que poderiam ter passado a olhos desatentos, entretanto, não aos meus. Guardei-as todas, pus-me a teorizar. Porém, fui surpreendido por um policial de Oxford, entrando bruscamente na sala. Ele me indagou:
"-Quem são vocês?"
O reverendo me olhou, esperando minha resposta, que foi:
"-Olá colega! Sou detetive também!"
"-Detetive? É um detetive particular? Quem lhe contratou?" Questionou o oficial.
"-Infelizmente, meu amigo, essa é uma informação confidencial."
"-Hum... Saiba que essa investigação está sendo conduzida pela polícia de Oxford! Mostre-me sua identificação!"
Mostrei-a e o homem se conformou. Disse para não alterar em nada na cena, prometi que o faria, mas eu mentia. Lhe perguntei sobre o caso e ele inocentemente, revelou:
"-Bem, estamos ainda na encalço do assassino. Temos a convicção de que o professor Rick foi envenenado por alguém. Além disso, acreditamos que ele sabia que isso poderia acontecer, pois soubemos, através de relatos que ele andava preocupado e inquieto. E você, o quê já descobriu sobre o caso?"
"-Nada mais do que vocês. Bem, preciso ir. Boa sorte no caso, companheiro." Encurtei a conversação.
"-Boa sorte pra você também, jovem." Disse-me o inocente e simpático policial."
Antes de sair ainda andei por todas as instalações e corredores do campus.E quando saímos, o reverendo me falou:
"-Um tanto dissimulado é o senhor, não acha, Michael?"
"-Hahahaha. Não posso negar que realmente fui. Mas veja, Curtis. Observe como é uma questão de aptidão individual esse ofício da investigação, ambos obtivemos os mesmos fatos, contudo, eu interpretei-os de uma forma, enquanto os policiais de outro. Não é fantástico?"
"-Sim, realmente é. Agora entendo porque Ray não confia na competência dos detetives da polícia de Oxford. Bem, adiante, qual será nosso próximo passo, jovem detetive?"
"-Não é óbvio? Basta encontrarmos Mary-Kate Houston para resolvermos o caso."
VII- A Dama de Cabelos Vermelhos.
De volta à nossa hospedaria, situei-me contemplativo, atento ao reverendo Curtis que segurava as contas do Rosário fazendo suas preces. Pensei em como certas pessoas podem ser frias e outras, podem ser extremamente movidas por seus sentimentos. Então, de súbito, um rapazote que trabalhava no hotel bateu-me a porta. Disse que o policial de nome Ray, estava subindo ao meu quarto. Senti que o garoto temia que eu fosse algum meliante e que o policial vinha me arrastar. Tranquilizei-o dizendo que Ray era meu amigo e eu o receberia.
Logo que adentrou, dispensei as formalidades, disse-lhe um simples "Olá" e tratei rapidamente de perguntar sobre o caso do homem morto e da mulher desaparecida. Ao passo que ele me respondeu:
"-Bem, este caso é um típico drama familiar, observado em muitos lares, infelizmente. Adultério. A mulher fugiu com um outro homem, segundo o que eu pude averiguar. Testemunhas relataram que ela saiu de malas prontas em uma noite com um alto homem desconhecido, por sorte nossa, a vizinhança é bastante atenta a vida alheia, se é que me entende. Agora, precisamos provar quem matou o marido da moça e saber para onde ela fugiu com o amante. Mobilizamos uma frota de policiais para
todas as estações que receberem viajantes de Oxford contando da data de uma semana antes do assassinato do senhor John Houston. Pedi para que chequem todos os registros de passageiros até encontrarem o nome de Mary-Kate Houston."
"-Mas e se ela estiver usando identificações falsas?"
"-Ela não está, penso eu. Concluí essa falha na fuga da mulher depois de termos procurado seus documentos pela casa, nenhum deles está na casa. Ou ela se livrou deles e assumiu uma nova identidade ou ela ainda os está usando. Espero que ela tenha cometido a proeza da segunda opção, jogar nos erros mais infantis do criminoso é um trunfo do investigador, jovem Michael."
"-Verdade. E se contarmos com o fato de que o criminoso possa ter agido de forma precipitada e movido por enormes apegos sentimentais, as chances de falhas tolas acontecerem multiplicam-se."
"-Isso mesmo. E você quanto a você, Michael? Vim aqui saber se tens alguma novidade sobre o crime com meu irmão..."
Recebi aquela pergunta com um certo tom de coação, senti que Ray suspeitava de que eu estava sendo omisso em relação ao caso de seu irmão.
"-Ray, estamos muito próximos de desvendar o caso de seu irmão, isso lhe asseguro! Peço que você me entenda, só vou lhe dizer todas as minhas teorias quando for o momento certo e nesse momento, eu as poderei provar."
"-Michael você é mesmo desse tipo de detetive que não revela nada antes de poder provar, certo? Eu entendo, aguardarei que o momento certo do qual você falou, chegue em breve.
"-Eu desejo o mesmo meu amigo. Ah, e por favor, me mantenha informado sobre o caso dos Houston, sim?"
"-Tudo bem." Provavelmente, Ray já começava a suspeitar do meu interesse no caso.
O reverendo Curtis observou toda a nossa conversa calado. Ele sabia pela minha expressão que eu não blefava mas não conseguia adivinhar o que se passava em minha cabeça. O tempo correu. Ja era noite e eu estive matutando durante todo o dia, era hora de descansar o corpo, a mente e aguardar.
Os primeiros raios de sol me acordaram como se eles fossem dedos levantando minhas pálpebras forçosamente. De olhos já abertos, saltei da cama e fui tomar meu café, me sentia acometido por uma excitação quase premonitória. Depois fiquei à janela observando as ruas. Curtis levantou e me viu estagnado, veio com um bilhete na mão, dizendo que o rapazote dali do hotel, recebera aquele papel que era destinado a mim, me perguntou se eu não havia escutado o menino chamar. Com a concentração particular na qual eu estava, era evidente que tinha ficado surdo para qualquer coisa que não meus pensamentos. O bilhete vinha da central policial, encontram Mary-Kate Houston e de fato ela cometera a tolice de continuar usando os mesmos documentos. Abri um enorme sorriso, troquei de roupa, enquanto Curtis tomava seu desjejum. Ambos nos aprontamos em poucos minutos, ao descer avistamos um cabriolé que nos aguardava, Ray estava nele acenando para nós. Dirigimo-nos a Delegacia de Polícia para a aguardarmos a chegada de Mary-Kate Houston e seu amante, que viriam escoltados pelos homens da Scotland Yard, encontraram a ruiva e seu mancebo em Londres. Acomodados no escritório de Ray, na delegacia de Oxford, ele nos explicou o caso:
"-Localizamos o nome dela nos registros da Estação Ferroviária de Londres um dia depois da morte de seu marido, em seguida ela continuou a usar seu nome no registro da casa de sua falecida mãe na cidade, foi lá onde os policiais a encontraram, um erro muito infantil, provavelmente o seu amante e cúmplice no crime também
era inexperiente a ponto de não avisá-la que seria óbvio procurá-la na casa vazia da falecida mãe. Agora precisamos descobrir qual dos dois matou o pobre John Houston. A Scotland Yard não se envolveu, pois o crime ocorreu aqui em Oxford, e não em Londres, eles só colaboraram conosco e conhecendo a eficácia dos policiais londrinos, logo estarão aqui com Mary-Kate e seu amante."
As palavras de Ray não foram exageradas, em poucas horas chegaram detidos a mulher de cabelos vermelhos e o seu amante, um garoto que aparentava ter no máximo 20 anos. Ray falou para um dos oficiais:
"-Levem-os para celas separadas, logo eu os interrogarei. Precisamos descobrir se foi um deles que matou John ou se contrataram alguém para o serviço."
Nessa hora eu tomei a palavra:
"-Ray, acredito que eu tenha a resposta para a sua questão, e talvez ela não seja nada agradável a você..."
"-Ora, Michael, não acha que já é hora de acabar com todo esse mistério e me colocar a par de tudo de uma vez?!" Ray estava enérgico.
"-Sim estou plenamente de acordo, mas para confessar todos os seus crimes, inclusive o que levou o seu irmão Rick à morte, precisamos estar diante de Mary-Kate Houston!"
"-O quê está dizendo?" Surpreendeu-se Ray.
"-Vamos, na frente dela, te direi minha teoria e a farei confessar sua participação no crime."
O reverendo Curtis lançou-me um olhar de contemplação e admiração. Os três fomos até diante da ruiva. No cárcere, a mulher estava grudada no canto da cela, seus olhos completamente marejados. Ray a apresentou:
"-Esta é Mary-Kate Houston, adúltera, que fugiu com um jovem conhecido apenas como Richard e possivelmente ela ou seu fedelho são os assassinos de John Houston!"
A mulher arregalou os olhos e veio para as grades, apertando-as como um gorila selvagem no cativeiro, exclamando aos berros:
"-Eu não sou assassina! Também Richard não é!"
"-Mentira!" replicou Ray, porém eu intervim:
"-Temo que ela esteja dizendo a verdade."
"-Mas como..?" insistiu Ray.
"-Diga logo,Michael. Nenhum de nós suporta tamanho mistério." reforçou o reverendo Curtis.
"-Concordo, meus amigos. Pois bem, essa mulher não é assassina, entretanto, é uma manipuladora da pior estirpe! Ela despertou o desejo e o encanto de três homens simultâneamente. Ela pôde ser amante de seu marido, John, do jovem Richard que pouco conhecemos mas pode-se observar que não passa de um garoto, e de seu irmão, Rick Olsen!"
"-Mas o quê você está dizendo, Michael?!" admirou-se Ray.
"-Isso mesmo, essa mulher era amante de seu irmão." Então a mulher que estava completamente frustrada e abalada pelo insucesso de seus planos, voltou para o fundo da cela de cabeça baixa e às lágrimas, dando razão às minhas palavras.
"-Vou explicar", prossegui eu, "De acordo com a linha de tempo que pude traçar no momento em que soube que ela fugira com um terceiro homem, essa inescrupulosa mulher manteve relações com seu irmão pouco antes de sua morte. Baseado na linha de tempo em que tracei, a primeira vítima foi John e a segunda morte foi a de Rick."
"-Cala essa boca! Cala agora!" gritava e se debatia a descontrolada criminosa.
"-Baseado em que você faz essas afirmações? Tem como provar isso?"
"-Sim, vendo agora o descontrole a falta de preparo desta mulher, vejo que ela própria vai confessar seus atos. Observe a sua reação demonstrando preocupação com as coisas que poderei revelar. Primeiro, na casa de Rick, encontrei um bilhete com a mesma caligrafia que encontrei na casa dos Houstom, reparei em um longo fio de cabelo vermelho na casa de Rick e uma arrumação dos móveis típicas de uma mulher, ou seja, ela frequentava a casa dele, e ainda senti o mesmo perfume feminino impregnado em ambas as casas, e nesse momento sentimos o mesmo perfume de nome "Encanto", vindo de Mary-Kate."
"-Eu não matei Rick! Nem John! Nem Richard, ele sim é um homem de verdade! Jovem, sem a mentalidade suja de vocês todos!"
"-Santa Mãe de Deus! Essa mulher é uma descontrolada! Suja é você! Deus tenha piedade de sua alma!" exclamou Curtis.
"-Sim, ela está descontrolada agora, e também quando deixou escapar provas tão claras de seus atos, que não passaram despercebidas aos meus olhos. Agora, Ray, peço que seja tolerante e mantenha a calma para o que eu vou lhe dizer aqui..."
"-Tudo bem, diga então! Vai me dizer que esta mulher mandou que matassem meu irmão e seu marido? Mas para que ela queria ter tantos homens?"
"-Não Ray, ela queria apenas um. Ela queria somente Richard, então, ela seduziu e induziu seu irmão, Rick Olsen, a matar o marido dela, John Houston."
Todos ficaram chocados, olhavam pra mim com uma enorme interrogação estampada nas faces. Mas a ruiva começou a confessar seus crimes, como eu esperava. Com a maneira que eu falava, demonstrava saber toda a verdade e parecendo ter as provas para assegurar minha credibilidade, diante disso, ela confirmou fatos que eu apenas tinha teorizado.
"-Não era para Rick morrer! Só o maldito John! Ele me tratava mal, me batia! Ninguém na vizinhança sabia ou suspeitava, eu agia normalmente com medo das ameaças dele! Eis que finalmente encontrei Richard! Ele era fantástico, jovem e bonito, um homem em formação, tudo o que eu precisava para me livrar daquele verme com o qual me casara! Me apaixonei por Richard, então pedi a ele que me livrasse de John, ele não foi capaz e eu também não queria que ele sujasse suas mãos... Oh, Deus!" ela engasgava com o choro e as lágrimas pesadas e atrapalhava suas falas em meio a soluços. "Fui até a faculdade de Oxford, onde Richard estudava para vê-lo, lá me deparei com Rick, ele era o que eu precisava, solteiro, de boa fé. Me envolvi com ele e mostrava pra ele todas as vezes as marcas das pancadas que John me dava, eu não usei Rick, ele que me perguntou como ajudar, queria ir falar com seu irmão policial, mas eu não deixei, menti dizendo que John iria me matar se eu tentasse me separar dele ou ir a polícia, então, Rick foi a nossa casa..."
"-Ah não, Rick era muito bondoso! Tentava agir sempre em prol dos demais..." começou a lamentar, Ray. Mas eu o consolei:
"-Não Ray, seu irmão foi usado! Ele não era assassino! Ele também foi uma vítima dessa lunática! Até o abusivo marido John foi vítima!"
"-Continue a falar, ou eu farei com que sua pena seja ainda maior!" Disse Ray para a mulher.
"-Rick chegou à nossa casa," prosseguiu ela, "eu abri a porta para ele. Falei que John estava furioso, por isso fiz um chá para ele com ervas tranquilizantes para que ele dormisse, ao vê-lo sentado, despertando da cama, gritei para que Ray fizesse algo, só que eu havia colocado na mão de John uma faca, o que fez Rick se amedrontar ainda mais, quando John abriu os olhos, Rick arrancou da mão dele a faca e apertou seu pescoço até a morte."
"-Isso mesmo", interrompi eu, "Rick matou John, porque foi manipulado por Mary-Kate, porém essa covarde mulher não tinha a intenção de relacionar-se mais com Rick, ela só queria Richard, ao descobrir isso, o profundamente arrependido e amargurado Rick, cometeu suicídio, tomando cianureto que ele mesmo pegou no laboratório da faculdade."
"-Que provas tem disso?" indagou Ray. "Como pode dizer que meu irmão se matou e não foi envenenado por essa víbora ruiva?"
"-Lembre-se, a porta da sala dele estava trancada por dentro, os peritos tiveram de arrombá-la para entrar, ele estava sozinho na sala, entrou ali deliberadamente com sua xícara cheia do veneno que ele pegou na sala de Química próxima a dele, como pude checar quando visitei a faculdade. E na sala de Química, encontrei o frasco da substância com apenas metade do líquido dentro. E neste período em que ele morreu, Mary-Kate estava a caminho de Londres com Richard, agora me diga, mulher, como foi que Rick soube de seu caso com Richard? Isso o deixou tão frustrado por seus atos, que ele foi levado a tirar a própria vida."
"-Eu mesma contei, através de um bilhete, ele provavelmente se desfez do papel e me respondeu com esse."
Nisso, ela sacou do bolso um papel e o atirou em nossa face. Ray reconheceu a letra de seu irmão e começou a chorar, a carta dizia:
" Não posso viver com tamanha culpa! Matei um homem, fui enganado e traído por você! Te dei tudo o que eu tinha, meu amor e minha vida! Agora que você mostrou quem é realmente e tem outro homem, a mim não resta mais nada, não quero mais viver. Carregue com você todo o peso da minha vida, adeus! "
Rick Olsen
VIII- "Epílogo"
Essa era a carta de suicídio assinada por Rick. E o desfecho acertado de minha teoria. O clima naquela delegacia estava completamente amargo. Tristeza e revolta eram os sentimentos de todos nós, mais ainda de Ray. A pérfida mulher teve a crueldade de dizer a Rick que apenas tinha usado-o. Que covardia! Essa notícia levaria a perdição de muitos homens apaixonados, para um pacato filósofo existencialista então, chegou a despertar-lhe o desejo de tirar a própria vida.
Mesmo muito abalado, o detetive Ray conteve o desejo de fazer justiça com as próprias mãos. Fez toda a lei ser cumprida, Mary-Kate Houston vai passar longos anos na prisão. Ela fora responsabilizada pela morte de Rick Olsen e mandante da morte de John Houston. O menino Richard, que de inocente não tinha nada, recebeu pena como cúmplice nos dois crimes. A justiça está sendo feita. O detetive Ray Olsen recebeu um recesso de seu trabalho para descansar seu corpo e sua mente. Toda a Oxford ficou abalada com as notícias do caso nos jornais, meu nome estava estampado em todos eles. Antes de voltar para minha cidade, recebi uma boa remuneração como havia me prometido Ray:
"-Parabéns detetive, você tem um futuro brilhante! Esse dinheiro não é nada comparado ao serviço que você me prestou!"
Fiquei um tanto encabulado, mas recebi de bom grado, como outrora. O reverendo Curtis olhava pra mim com expressão de orgulho e dizia que meu pai ficaria muito feliz também pelo meu sucesso. Depois despedi-me de meu fiel companheiro Curtis e rumamos cada um para a sua terra.
Um tempo depois dessa aventura em Oxford, recebi uma carta com uma menção honrosa, vinda de Bampton e assinada pelo prefeito Widmore, meu pai fez questão de emoldurá-la na parede, e ficava horas apreciando minha identificação de detetive. Agora de fato eu me sentia um investigador, comecei a ficar conhecido pela Inglaterra como o detetive Michael Baslerville, aquele que resolveu o mistério de Bampton e os crimes em Oxford.
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